quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

‘Apenas um clube diferente’


O Botafogo – e todos vocês torcedores do clube sabem disso – sempre foi um clube de fazer as coisas em cima da hora. Chega a viajar sem carregar o segundo uniforme, como aconteceu na Espanha, há pouco tempo, quando teve que enfrentar o Juventus de Turim – na sensacional decisão da Taça Teresa Herrera – com as camisas do La Coruña.

Houve outra vez, já não me recordo quando, pois minha memória não é de ferro, que o Glorioso utilizou as camisas amarelas da Suderj numa partida pelo Campeonato Brasileiro. Foi na década de 70, tenho certeza, pois me lembro de Rodolfo Fischer numa camisinha (sem segundas intenções) ridícula, curta demais para ele.

E é bom que Maurício Assumpção fique sabendo que em 1955 já era assim. Imaginem os leitores que a delegação do Botafogo – chefiada pelo meu futuro companheiro de redação Sandro Luciano Moreyra (1919-1987) – saiu do Rio às pressas para uma longa e penosa excursão pela Europa.

O Alvinegro de General Severiano foi embarcado num dos Constellations da Panair do Brasil (cansei de me arriscar a bordo deles) e desembarcou em Madri, no Aeroporto de Barajas, na hora em que devia estar em campo para enfrentar simplesmente o Real Madri, campeão europeu.

Foi aquela correria, claro. No Real Madri jogava o craque Alfredo Di Stefano.

Para fazer média, é óbvio, Sandro descolou uma bandeira da Espanha e o apaixonante Botafogo entrou no Estádio Chamartin com seus jogadores mortos de cansaço.

O time (poucos leitores viram essa equipe) jogou com Lugano, Orlando Maia, Gérson dos Santos e Nílton dos Santos (verdadeiro nome da Enciclopédia do Futebol); Danilo Alvim (Juvenal) e Ruarinho (Robert James Neil, o Bob); Garrincha, Quarentinha, Vinícius, Dino da Costa e Hélio (Neivaldo). Dino abriu o escore, o Real Madri empatou e desempatou mas Dino voltou a dar números definitivos aos 2 a 2 da estréia.

Daí em diante foi um sufoco. O Botafogo, na excursão arrumada pelo empresário José da Gama, viajava e jogava, jogava e viajava. Houve um momento em que o ponteiro-esquerdo Hélio, também conhecido como ‘Boca de Sandália’, chegou perto de Sandro (pai da Sandra Moreyra da Rede Globo) e perguntou:

- Seu Sandro, há quanto tempo estamos viajando?

Moleque como sempre, desde aquela época, simplesmente respondeu:

- Dois anos, Hélio. Por quê?

Hélio acreditou e disse que estava com saudades de casa. Sandro, então, sugeriu que ele escrevesse uma carta. Veio então a surpresa:

- Acontece, seu Sandro, é que estamos a tanto tempo viajando que me esqueci do endereço lá de casa...Minha mulher deve ter pensado que morri...

Anos mais tarde, na redação do sempre querido Jornal do Brasil – onde comecei minha carreira no dia em que John Kennedy foi assassinado em Dallas – perguntei a Sandro porque o Botafogo era assim, tão improvisado (preferi não dizer desorganizado) e ele, parodiando o slogan do Salgueiro, me respondeu com a maior cara de pau:

- O Botafogo, Roberto, não é o que você pensa. O Botafogo é apenas um clube diferente...

Acho que Sandro, que já se foi há tempos (nem viu o retorno do clube a General Severiano), sempre teve razão. E é bom que Maurício Assumpção saiba muito bem o clube que está assumindo. Um clube diferente...

10 comentários:

Anônimo disse...

Sensacional!!
Como tudo o que escreve e pensa, Roberto.
Por favor, não tire mais férias, esceva 24hs por dia!hahaahaha!

É um bálsamos esses seus textos maravilhosos...
Eu me sinto vivendo tudo isso.
Como em seu livro...Inigualável livro.

Obrigada pelo seu Botafoguismo, obrigada por esse seu amor incondicional ao Botafogo, obrigada, Deus, por esse talento que te deu.

Beijo na testa!
Malu

Vinícius Barros disse...

Roberto Porto, eu o invejo e ao mesmo tempo, tenho mais e mais orgulho de ser BOTAFOGUENSE. O Maurício Assumpção, assim como outros 3 milhões de sábios alvinegros, foram "enfeitiçados" por você e outros gênios! O Botafogo não seria o mesmo sem vocês! Obrigado!

Saudações Alvinegras!

Renan disse...

Eu já andava meio cabisbaixo sem seus escritos. Mas, agora tudo voltou à normalidade!

Grande abraço!
Feliz 2009!

Anônimo disse...

Legal demais, Roberto. Grande história e relato sobre o Fogão.

Sou vascaíno, mas, como grande admirador do futebol carioca, vejo no Botafogo essa aura de "um clube diferente". Há uma grande magia que permeia o imaginário do torcedor botafoguense e sustenta a mítica da estrela solitária.

Abraços.

Saulo disse...

É a primeira vez que estou visitando o seu Blog e parabéns pelos textos que são show de bola.
O Botafogo é um clube simpático, diferente e apaixonado por milhões de torcedores espalhados pelo Brasil.
Maurício sabe disso e estamos apoiando.
Tomara que dê tudo certo esse ano. Esse time é bom e pode dar certo.

Valeu amigo e até mais.

EU CANTAREI POR TI, MESMO QUE A VOZ ME DOA!
saulobotafogo.blogspot.com

Anônimo disse...

Porto,

Muito bom tê-lo de volta.
Um grande abraço.

Alejandro

Anônimo disse...

Até que enfim; lendo vc, amar o Glorioso fica, digamos, mais LEVE...fosse eu um poeta, certamente agora nasceriam lindas palavras sobre nosso 'amor imaterial'...obrigado Porto.

Duda disse...

Roberto Porto,

Mais um texto sensacional! Somos realmente um clube diferente, com cabeça e que não nos deixamos levar pela maioria...

Saudações Alvinegras e um 2009 Campeão para nós!

Roberto Porto disse...

Assim eu fico mal acostumado...
Vocês não imaginam o que sinto quando relembro tudo isso.Chego a sentir o cheiro do lugar.
O Botafogo realmente é sem limites!

Saudações Botafogueses
Roberto Porto

Anônimo disse...

O ano em que o Botafogo jogou de camisa amarela foi no campeonato brasileiro de 1976. Saiu inclusive na revista "Placar" com a seguinte chamada - se não me engano: - "Botafogo amarela e dá sono".O Botafogo é assim mesmo.É grande do mesmo jeito.É o maior do planeta.