domingo, 2 de maio de 2010

Mitos e superstições em torno de um clube


Confesso aos leitores deste blog – que se aproxima de 100 mil visitas, o que é um grande orgulho para mim – que não sou chegado a crenças, descrenças, numerologias, horóscopos e outras coisas mais. O fato concreto, porém, é que o imortal Glorioso muitas vezes nos prega peças inexplicáveis, daí o ditado que diz que ‘há coisas que só acontecem ao Botafogo’. Eu acrescentaria que há muitas coisas ruins e outras tantas boas ou ótimas, como esta última decisão diante do Clube da Beira da Lagoa. Exatamente 21 anos depois daquela final contra o mesmíssimo Urubu, voltamos ao Maracanã para enfrentá-lo uma vez mais. E aí o tal do 21 aparece uma vez mais.

Confesso, também, que tenho lá minhas superstições – mas não as revelo nem sob tortura. Mas no dia da decisão, meu irmão Maurício Porto (botafoguense como eu) me ligou para dizer que aquele era o jogo de número cinco mil do Glorioso (hoje já estamos com 5002). E Maurício, que adora números, afirmou que o número cinco mil não era bom para nós. Explicou que cinco é um número não mais do que intermediário, com tendência para subir ou descer. E isso não era legal para o Botafogo do nosso coração. Não liguei muito para o fato, até porque como os árabes inventaram o zero, o cinco está mais para cima do que para baixo. E fui em frente.

E só ontem à noite, graças a um e-mail do médico Marcus Vinícius Minucci, me dei conta de que nossa vitória por 2 a 1 (olha o 21 aí outra vez) sobre o Urubu, com aquele gol incrível de Loco Abreu e a defesa de Jefferson, estava completando 21 anos da partida de 1989 sobre o mesmíssimo Urubu Medonho, apelido que o botafoguense Tarzã (Otacílio Batista do Nascimento), já falecido, deu ao rubro-negro ainda na década de 50. E a torcida do Beira da Lagoa, sem opções, acabou adotando como mascote, através do cartunista Henfil (também falecido), nas páginas do outrora famoso Jornal dos Sports (que me deve dinheiro há anos) e hoje troca de donos.

Por isso, por uma questão de justiça – e de bom gosto, também – publico hoje, em meu blog, a crônica que ele escreveu e que faz questão de que seu filho, de sete anos, possa ler e guardar. Eu, particularmente, e revelo isso ao doutor Marcus, também tive o imenso prazer (olha a letra do hino aí...) de saber que meu neto, Rafael Porto, que caminha para completar 11 anos, também estava lá nas arquibancadas, acompanhado de meu filho Roby Porto (Sportv). E Rafael já havia assistido à conquistas de outros troféus (taças Guanabara e Rio) mas não vira ainda a conquista de um título como este de 2010. Fiquei muito feliz por isso. Mas muito mesmo.

E aí, com todas as letras, vai a crônica de Marcus Vinicius. Aproveitem todos. Mas não se esqueçam de que não acredito nos chamados ‘deuses do futebol’ e estou certo, mas absolutamente convencido e repito que há realmente coisas que só acontecem ao meu querido Botafogo. Mas volto a acrescentar: há coisas más, mas há também muito boas, como esta de agora, inesquecível sobre nosso mais feroz inimigo no futebol.


21 depois de 21

Marcus Vinicius Minucci


 No dia 21 de Junho de 1989 o Botafogo foi campeão, após uma peregrinação que parecia interminável. Cresci ouvindo dos mais velhos que o Botafogo ia acabar, ia fechar as portas porque não ganhava nada há 21 anos. Mas o amor pelo Botafogo era o legado de meu pai, que, ao mesmo tempo, me contava as glórias de Garrincha, Didi, Quarentinha, Amarildo e Zagalo. E eu, embalado por essas histórias de heróis do passado, resisti, e vi meu amor por esta singular Instituição crescer na vicissitude.

Passaram-se 21 anos do dia em que eu não estava lá, pois na época era estudante de Medicina e no dia seguinte iniciaria uma sucessão de provas de final de período.

Na tarde ensolarada 21 anos depois, enfim, comemorei meu titulo de menino. No dia seguinte, também haveria uma sucessão de provas, mas agora como professor da Faculdade de Medicina.

Estive presente nas três decisões anteriores contra o Flamengo. Eu, eu meu filho Mateus, de 7 anos, e meu amigo Humberto. Na ultima decisão, quando o Flamengo começou a massacrar o Botafogo, chamei meu filho e saímos mais cedo. Na saída, ao passarmos pela Avenida Radial Oeste, fomos xingados e aviltados pelos flamenguistas. Então olhei para meu filho, que, assustado, ameaçava chorar, e prometi que um dia estaríamos saindo felizes do Maracanã. Ressalto que Mateus, de apenas 7 anos, já havia presenciado todas as duas derrotas anteriores do Botafogo para o mesmo Flamengo. Fomos a uma pizzaria, e, novamente, flamenguistas por todos os lados...

Passou o tempo, que tudo corrige e torna ao seu lugar, e, face a perspectiva concreta de um titulo naquela tarde, voltamos ao Maracanã. Ao chegar ao “maior do mundo”, primeira surpresa: Estávamos dividindo o estádio com a torcida do Flamengo! Algo diferente pairava no ar... sentíamos, todos nós, e até os flamenguistas, que estávamos escrevendo a história naquela tarde.

E vieram os gols e a festa incrível da torcida, até que aos 33 minutos um pênalti para o Flamengo... Olhei para meu filho e, confesso, as lagrimas, desta vez, vieram aos meus olhos. Eu não acreditava que aquela historia de derrotas fosse se repetir pela quarta vez consecutiva, e, pior, que eu estava expondo meu próprio filho a tudo aquilo outra vez. Foram segundos intermináveis da tênue fronteira que separa o pranto do riso, a dor da alegria, as trevas da luz, numa fusão quase metafísica de tudo que simboliza o Botafogo....Mas, veio a defesa de uma bola que não podia encontrar as redes, e finalmente a explosão em lagrimas pelo feito de nosso herói...

Os minutos finais foram extraídos de uma Epopéia Grega, como são as grandes decisões envolvendo o místico Botafogo. Não conseguíamos mais gritar. Estávamos, eu e Mateus, de mãos dadas, e nos olhávamos a cada ataque do Flamengo que parecia nos sentenciar novamente ao sofrimento. E o jogo não acabava, e as bolas pareciam ter se multiplicado no gramado, todas chegando perto de nosso goleiro-herói.

E eis que, num ínfimo gesto, o juiz se aproxima da bola e ergue seus braços, um gesto quase ritual que nós, membros dessa imensa torcida, repetimos, atônitos, aliviados, exultantes. Terminava o jogo, e meu filho me abraçou forte, chorando, assim como eu e nosso amigo Humberto. Nada poderá delinear o que vimos e sentimos naquele ínfimo instante que saímos da dor para a mais intensa alegria. Meu filho soluçava, a torcida exultava, e eu, enfim, vi, junto de meu menino, meu sonho de menino se realizar.

9 comentários:

Chico da Kombi disse...

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FORÇA FOGÃO!

Loco 13
neles!

Gloriosas Saudações Alvinegras.

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Carlyle Barral disse...

Tudo isso no ano de 2010 (olha o 21 aí de novo...)

Tauan Ambrosio disse...

Texto extraordinário, lembrei do jogo, que assisti ao lado do meu pai, botafoguense fanático. E do mesmo jeito, que fiz quando o juiz ergueu as mãos, levei minhas mãos aos olhos para enxugar as lágrimas e lembrar a alegria de ver o time não somente ser campeão, mas sobre o mais odiado rival, e ao lado da pessoa que graças a deus passou essa louca paixão para mim.

Unknown disse...

Caro Porto:
O título é muito "criativo". O Minucci só esqueceu de mencionar o criador: Rafael Casé que, com Paulo Marcelo Sampaio, desenvolve há um ano o livro "21 depois de 21" que será lançado no dia 21 de junho de 2010, no Botafogo, congregando os campeões de 1968, 1989 e 2010.
Saudações Botafoguenses,
Cesar

Unknown disse...

Grande Porto,

Fantástica a publicação do texto do meu amigo Marcus Vinicius Minucci, oriundo de uma nobre família botafoguense, que passa esse amor de pai para filho. O Humberto a que o Marcus se refere sou eu e estive lá, com ele e com o Mateus, sempre presente desde o título de 2006.
E o fantástico livro "21 depois de 21", do Rafael Casé e Paulo Marcelo Sampaio, virá para coroar esta nossa imensa alegria.
VIVA O BOTAFOGO E VIVA O NOSSO AMIGO ROBERTO PORTO !!!

Humberto Cottas

Estrela Solitaria disse...

Caraca!!!!!,

Esse texto me fez reviver os meus 16 anos, em 1989, confesso que os olhos lacrimejaram.

sds

Gil disse...

Mestre Porto,

Também estava lá!
Fiquei nas arquibancadas amarelas e vi quando o Robby passou com o seu neto.
Como bem descreveu o Marcus, o clima estava diferente e a imprensa pouco comentou sobre estarmos em maior número nas arquibancadas.
Mestre, nos dias seguintes ao jogo estava com dores musculares nos ombros, braços e pernas de tanto agitar e vibrar com a nossa bandeira. Foram três anos de muita angustia.

Valeu Mestre!
Valeu Marcus!

Abs e Sds, BOTAFOGUENSES!!!

Enéias Teles Borges disse...

Sou botafoguense e consigo sentir cada palavra digitada. Ser botafoguense é isso mesmo: ganhar o que parece impossível e ver escapar das mãos o que é certo (Lembram-se do Juventude?). Ainda assim eu me sinto um privilegiado. Gosto de ser torcedor do Glorioso.

Abraços.

Anderson Lessa disse...

Excelente texto!!!